Uma fotografia apontada à cabeça

Ao terceiro volume, José Anjos assume-se como voz única e distinta no panorama nacional. Perante as múltiplas possibilidades de ser, sempre na queda, surge sempre uma definitiva e só nossa: árvore de versos onde a criança é fruto prestes a tombar. Quase nunca na primavera do amadurecimento. Assume-se ainda cruzamento em hora de ponta no trânsito com outras artes, da pintura à música, em busca da experiência total da palavra.

«O livro decorre ao longo de inversões e inflexões de todas as camadas de afecto de que somos feitos: da memória de uma infância sublime, ao medo da demência que a tritura. Da constatação de ciclos de dor, que embora unidos por laços de reencontro, se desfecham na finitude, como porta para o vazio, onde nem a solidão tem lugar para fazer companhia… Nem a morte… o medo de não morrer e só ficar a ausência de vida. Da psicose onde o pensamento se fragmenta e não é possível encontrar a cola para voltar. Da saudade de colos que já não se têm e da desesperança de que outros possam preencher, ou reconfigurar, o lugar onde estes faltam. Do cansaço que pesa sobre o dorso e que se impõe sob a forma de tempo. Do tempo que não volta para trás e que já não chega para ganhar a esperança do encontro à frente. Dos recados que também não chegam porque afinal sozinhos estamos, nesta insuportabilidade de estarmos vivos sem o sentir. Da nossa insignificância quando só de memória nos fazemos. Da agonia da infância, como agonia de vida. Da vida, só vivida pelo reforço da morte, e do reforço do eu pela minha negação. Da perda como recondução constante para A GRANDE PERDA, a única, aquela que todos tememos dizer, para que só suposição. Do desejo de amor pleno, à constatação do amor efémero. Do amor que salva, ao amor que mata. Do que mata o instante e perpetua a vida. Do tempo da vida, ao tempo da sua renúncia. »

Ana Teresa Sanganha, da Apresentação

Rio das Pérolas, de João Morais