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A liberdade problemática

«A questão do terrorismo coloca-se igualmente neste tipo de parábolas actuais que disputam toda uma possível história do sentido. O mundo metaforizado por Paul Auster é, afinal, um mundo muito real, dominado por disjunções inexplicáveis e por ameaças maiores que, no entanto, nunca se tornam inteligíveis. O que acontece supera quase sempre a sua significação. É um facto que sempre existiu uma relação particularmente difícil entre a ética (o ‘dever ser’ interior) e as práticas do terror ou do mal. Susan Neiman afirmou que, desde o Iluminismo até ao presente, sempre existiram dois pontos de vista antagónicos a este respeito. O primeiro, que vai de Rousseau a Hannah Arendt, insiste que a moral nos obriga a tornar o mal inteligível. O outro, que vai de Voltaire a Jean Améry, insiste que a moralidade nos obriga a não o fazer. Esta ambiguidade traduz um campo fértil para a entrada em cena da personagem mais espessa do nosso espectáculo actual: a crise.»

Luís Carmelo, no Hoje Macau (14 Janeiro 2021)

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