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Temos de falar sobre isto

Valério Romão no Hoje Macau (24 Maio 2021)

«Quando a medicina capitula, consciente dos seus limites tecnológicos e éticos (sim, há uma ética em comunicar o fim, uma ética sobre a qual se funda, aliás, todo o edifício do que deve ser o comportamento adequado de um médico) entra então sorrateiramente a chamada «terapia alternativa». Normalmente, não promete a cura. Regra geral, as terapias alternativas são astutas em relação ao que oferecem (até porque a única coisa que têm, de facto, para oferecer, está do lado do paciente e reside na capacidade que este tem de ser sugestionado). Não podem oferecer uma cura, pelo menos ao modo da medicina, porque não a têm. Pelo que têm de percorrer caminhos tão alternativos como o adjectivo que as qualifica. Na maior parte das vezes, dizem-se preventivas: nesse aspecto são uma espécie de «medicina» no sentido grego da palavra: uma forma de vida cujo objectivo fundamental é preservar a saúde e impedir a doença. Mas quem muitas vezes lá chega já está para lá desse pináculo. Precisa de soluções. Não podendo prometer curar o cancro (e, ainda assim, alguns têm o descaramento moral de o fazer, sendo essa forma de exploração da fragilidade alheia um dos rostos mais asquerosos da ganância humana) advogam toda uma panóplia de mezinhas para «tornar a vida mais confortável», «ajudar com os efeitos secundários», «lidar com a dor» e, com alguma esperança (quase sempre albardada no lombo do paciente que «tem de ter fé no poder se curar!», recaindo sobre este o motivo do sucesso ou insucesso da terapia), «prolongar a vida» ou mesmo «ousar o milagre», coisa que dizem quase em surdina, acendendo assim uma luzinha na consciência do desesperado sem se comprometerem em demasia.»

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