Pelos olhos dentro

Quarenta anos depois, e a convite da Câmara Municipal de Viana do Castelo, desafiámos outros tantos ilustradores, esses mestres do efémero, para reinterpretar os ícones que ficaram como tatuagem daqueles meses febris. Reinterpretar sem constrangimentos, como quem regressa a um texto clássico para o reler e trazer à cena com os olhos e as mãos de hoje. A ilustração é uma arte que consegue condensar num fósforo todo o fulgor de uma ideia, de um acontecimento, e fazer arder tudo em símbolo, em metáfora, em desenho e cor. Encontram-se nestas páginas várias gerações de artistas, alguns que viveram, ainda novos, claro, a revolução e os meses que se seguiram; outros apenas sabem a partir dos livros de História, ou só dos livros ou apenas das histórias. Encontramos página após página a imensa diversidade de estilos em que hoje se ocupam os nossos ilustradores, que são dos melhores do mundo: traço solto de cor, trabalho em computador, gravura, proximidade ao desenho ou à pintura, colagem, expressionismos, surrealismos, linha clara. Nestas experiências, de grande sentido lúdico, cabe-nos a nós, leitores, prolongar o jogo escrevendo as legendas para cada um dos cromos, estabelecendo os nexos que nos forem mais convenientes, os da memória mais ou menos íntima, os de uma análise fria, que misture estética e história, ou apenas estática e prazer.
João Paulo Cotrim, na Introdução