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A invenção da alegria

Paulo José Miranda, no Hoje Macau (27 Abril 2021)

«Fez ontem, 26 de Abril, 25 anos. Infelizmente, Jungersen não deixou mais nenhum livro além de «A Grande Invenção», onde nos mostra, através de mais de duzentas páginas, como «[…] a grande invenção humana não foi a roda, a penicilina ou o foguetão que nos levou à lua, mas a alegria.»
No século XIX, Darwin escrevia que a capacidade de adaptação era a grande responsável pela sobrevivência das espécies e, concomitantemente, dos espécimes. E, segundo Jungersen, a alegria é indissociável da capacidade de adaptação. A capacidade de adaptação não se define apenas em relação ao clima, à alimentação, às contrariedades físicas, mas também em relação à capacidade de se ser alegre. Escreve, logo na página 17: «Sem alegria, ninguém sobrevive.» E, depois de várias páginas onde percorre várias doenças psicológicas, como a depressão, o transtorno de ansiedade e o transtorno obsessivo-compulsivo, ligando-as à falta de alegria – «[…] todas estas doenças têm como principal problema a incapacidade de produzir ou de encontrar alegria. É a falta de alegria que está na base do problema e que é comum a todos os distúrbios psicológicos mencionados antes. As diferentes expressões da doença é o modo como a pessoa reage a essa ausência de alegria.»
Mas o que é a alegria? Ou o que é que o autor dinamarquês entende por alegria, que acusa de ser a maior invenção humana? Leia-se as páginas 32-3: «Em a Epístola aos Filipenses, Paulo escreve: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Repito: Alegrai-vos!” A palavra alegria vem de um verbo grego “phyo”, que significa “produzir”, querendo com isso significar que quem é alegre é produtivo, fecundo. […] Independentemente de uma posição religiosa, o que está em causa é que a alegria, seja no Senhor ou no Universo, é fundamental. A alegria é criadora de vida. É a alegria que permite que possamos ver o futuro como um lugar que não nos é hostil, que nos permite ver adiante e aligeirar o medo.»
A alegria, enquanto invenção, não é apenas a criação de vida, mas a criação de sentido para a vida, porque «[…] alegria é uma disposição que nos afasta do peso de todos os fins. E todos os fins, quer seja o de uma relação amorosa, o de um projecto em que se está envolvido ou o da própria vida ou daqueles que amamos, são impeditivos de continuação. Viver com a visão do fim continua ou frequentemente impede que a vida avance. E a alegria é esse desbloqueador. Depois de ganharmos consciência, de sabermos que tudo tem um fim, era preciso um antídoto para que a vida não bloqueasse de vez. A alegria é esse antídoto, essa grande invenção, que permite que o ser humano continue, apesar da consciência.»
Jungersen faz também a distinção entre capacidade de criar alegria e capacidade de encontrar alegria. «Ambas são importantes, pois são elas que nos colocam nos eixos do futuro, de vermos a vida com sentido ou, pelo menos, de não vermos a vida sem sentido nenhum. Há, contudo, duas capacidades diferentes: capacidade de criar alegria e capacidade de encontrar alegria. A primeira é aquilo que podemos definir como capacidade de criação e a segunda a capacidade de encontrar as criações que promovem o bem-estar. […] em ambas, é fundamental a aceitação da alegria. Pois não é de todo certo que aquele que cria ou aquele que encontra alegria a aceite. Podemos criar e recusar essa alegria, recusar participar na própria dádiva de vida que foi criar. Assim como podemos encontrar a alegria a cada esquina e constantemente rejeitá-la. Por conseguinte, a despeito de se criar ou de se encontrar alegria, a capacidade de aceitá-la é determinante.»
No fundo, o que parece estar em causa neste livro é mostrar que, contrariamente à ideia generalizada de que a tristeza pode ser um grande propulsor de criação, é a alegria que produz, porque é ela que permite que continuemos a projectar futuro e a ter forças para continuar, apesar de todas as contrariedades. «O mundo, sem alegria, não seria uma tristeza; simplesmente não existia. Embora pudesse existir a natureza.»»

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