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Conjecturar vidas nos retratos

Luís Carmelo, no Hoje Macau (6 Maio 2021)

«Contar uma vida através dum retrato é uma caminhada entre a imagem e o poder da conjectura. Peirce reviu no conceito de abduction todo o imenso poder da conjectura. Para o autor, a conjectura é uma actividade humana da thirdness, o que significa que antecipa, prevê, constrói e projecta para o futuro a partir do que lhe é dado (e é, também, uma categoria que, como o autor sublinhou, está ligada ao “interpretante”, ou seja, encontra-se directamente conectada com o processar ilimitado das imagens que constituem, em cada instante, a encenação da consciência).
O poder de conjecturar não é apenas um poder de antecipação, ele é igualmente um poder de natureza poética, pois está ao seu alcance conceber o que antes nunca foi criado. Este lado criativo da poiesis assegura a projecção de figurações originais e modelares sem tradução nas palavras. Trata-se de um misto de intuição e de previsão de algo que parece dado ou até óbvio. A conjectura é, pois, uma arte alheia à sintaxe conceptual e, por isso mesmo, capaz de trabalhar com hipóteses mais idealizadas do que racionalizadas. »

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